segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Quem?

Meu amigo disse que meu irmão está mais parecido comigo do que eu próprio. Legal. Estou no caminho certo. Meu irmão, nem tanto.

domingo, 23 de novembro de 2008

Ouro puro

Acho que vou voltar, apesar do destempo. Pra começar, vou postar um texto que escrevi já tem um bom tempo, logo depois da época em que roubaram um relógio do Luciano Huck, nem lembro mais quando, e que encontrei aqui nos rascunhos. Como o que interessa não é a notícia, taí.









Cheguei atrasado. Acabei de descobrir que o Luciano Huck foi assaltado. Levaram seu Rolex. O cara ficou puto, e escreveu um manifesto na Folha de São Paulo. Pra ler o artigo, precisa de senha de assinante, mas eu achei alguém que fez o favor de jogá-lo na roda. Dá uma olhada e depois volta aqui.

Viu? Foda né? Pois é. Aí teve uma galera que ficou puta com a putisse do Huck. Tem aí na internet, pra todo lado.

Teve um cara aí (rapper, parece) que criticou, tentando mostrar o lado dos bandidos e pá, que não tem oportunidades e não sei o quê. Outros falaram que é só uma raivinha de burguês, que, como tal, acha que a polícia tem que proteger seu mundinho de playboy, como se fosse seu empregado particular.


Outros apoiaram, com argumentos mais ou menos no sentido de que violência é violência, seja contra quem for, que lugar de bandido é na cadeia e que ser rico não é pecado.

Li algumas dessas críticas, achei algumas bem escritas, tanto de um lado quanto do outro.

Bem, o bonde já andou. Mesmo assim vou falar a respeito, porque veio à tona um aspecto que sempre me incomodou.

Eu acho mesmo que nada justifica o banditismo, ainda que algumas coisas possam, em tese, explicá-lo. É muito revoltante trabalhar pra conseguir as coisas e depois ser roubado e humilhado. Assim como ser vítima de qualquer tipo de injustiça. Qualquer um que já foi assaltado sabe disso, é uma sensação indescritível de tão ruim, principalmente quando não tem condições de comprar outro do que foi levado, e aí vai lembrar por muito mais tempo do ocorrido. Isso se não apanhar ou morrer.
Do mesmo jeito que os ìlustres e vossaexcelentes detentores do poder político justificam qualquer atrocidade cometida usando o argumento interesse público ou outra babaquice assim, quem é safado e vagabundo aparece com o papinho de que os outros são ricos e rico é desgraçado.

Rico ou pobre, todos deveriam ser protegidos.


Por outro lado, acho que o Luciano ficou muito nervosinho, falando como se tivesse sido vítima da maior tragédia do mundo, quando ele simplesmente passou por uma experiência que, apesar de horrível e inaceitável, é muitíssimo corriqueira e que não trouxe NENHUM prejuízo pra ele, porque não sofreu nenhum arranhão e o valor do relógio é dinheiro de troco pra ele, bem como para a sua digníssima (e absolutamente sem graça ou talento) esposa ou qualquer outro dos seus amigos VIP.


Pra falar a verdade, senti até um certo despeito no texto do Huck, como se ele tivesse achado um pouco ruim o fato de os assaltantes não terem aliviado a dele, afinal de contas ele é famoso, porra! É carismático, dá 10 mil para o povo no seu programa, conserta carro velho da galera... Acho que ele queria que os caras chegassem: - Aí playboy, perdeu! - Não cara, vambora, é o Luciano Huck, foi mal Luciano, até mais, vai com Deus...


Já fizeram isso com o Pelé, não foi?

Mas tem uma perspectiva que foi menos explorada das opiniões que eu li: o que representa o objeto roubado - um Rolex.

Segundo a imprensa, o relógio vale em torno de 50 mil reais (R$50.000,00). Aliás, custa, mas nem de perto vale, na minha opinião. Pra quem nunca viu um Rolex de perto, informo que ele não faz nada além de marcar as horas, talvez o dia do mês. E é aí que mora o problema.

Eu morro de preguiça, pra falar o menos, de jóias. Pra mim, é o cúmulo da indiferença, soberba, ostentação. Serve pra nada. Enfeite precisa só ser bonito, uai.


Um carro mil, tipo um Uno, custa X. Um Pajero TR4, uns 3X. Qual é a diferença? Fora o status, um é condução, enquanto o outro é carro. Um tem freio que é uma repetição do mesmo principio dos freios que eu fazia nos meus carrinhos de rolimã; o outro, freio a disco, com ABS nas 4 rodas, e air bag duplo. E por aí vai. Justo ou injusto, existe uma justificativa na diferença de preço, que é a tecnologia.

Mas qual é a diferença entre uma jóia e um artigo análogo, mas não "nobre"? E não estou sendo irracionalmente radical não. Não estou comparando um reloginho Cassio preto digital com um Rolex não.


Mas a verdade é que com 2 mil reais (que já é muita grana pra se empregar num relógio), um homem consegue, sem maiores problemas, comprar um ótimo relógio, com visor de safira (que não arranha, igual ao do Rolex), com máquina Suíça (igual ao Rolex), muito mais bonito que o Rolex (cujo design, na minha opinião, não tem nada demais, super antiquado), movido à luz (não precisa nunca de trocar bateria e nem balançar no braço) e que ainda tenha alarme, cronômetro, contagem regressiva, e por aí vai.

Ah, mas o Rolex é de ouro. E daí? Pra que serve um relógio de ouro? Respondo: serve pra ser de ouro.


Ostentação é a palavra. E isso é perverso.


O Luciano Huck é tido como talentoso, trabalhador, alguém que nasceu com boas condições mas que venceu por seu próprio mérito. E que ainda ajuda os outros, tendo fundado até mesmo uma ONG, que supostamente é eficiente e séria. Certo. Conheço de perto outras pessoas que também venceram pelo próprio esforço, que também ganham muitíssimo dinheiro, e que também (supondo que o Huck seja) são bastante generosas.


Mas, como brasileiros endinheirados que são, padecem da mesma doença: ostentação crônica.


Ostentação é besta, é coisa de ditador megalomaníaco. É inadequado, e como tal, é brega. No Brasil e em outros países com a nossa desigualdade social então... é uma ofensa séria, é um tapa na cara, é um 38 apontado pra cabeça. Acha exagero? Tem certeza? Pois o 38 apontado para o Huck significou pra ele a humilhação de ser vítima de uma injustiça e ser absolutamente impotente frente a situação. Uai, pra qualquer pessoa que não seja muito bem de vida, uma pessoa da classe média, por exemplo, é humilhante saber que, no fim da vida, vai dar graças a Deus se tiver conseguido comprar uma casa, ter um carro, enfim, ter juntado um patrimônio que garanta a velhice. Ou seja, trabalhar a vida toda pra conseguir uns 4 ou 5 presentes de aniversário de gente rica. Isso é uma injustiça contra a qual não há o que se fazer (licitamente), salvo aceitar ou morrer de raiva. É um 38 apontado para a cabeça.

Ostentar é tripudiar, é desprezar milhões de pessoas. É fazer como o Quico faz com o Chaves: eu tenhoo, você não teem...E nunca vai ter, a não ser que tome um, enquanto o Quico faz terapia para tentar controlar sua infelicidade, angústia e frustração por não existir uma bola quadrada para comprar no shopping.


É esfregar na cara das pessoas a verdade do Brasil - a grande maioria das pessoas nunca vai conseguir, durante a vida toda, acumular o equivalente ao que, para os "Quicos", é só um agradinho, um mimo, um... presente.

Acho que o Huck tem tanto dinheiro que perdeu a noção, que não percebeu quão ridículo foi o seu papel de chorar as mágoas publicamente, num jornal tão famoso, expondo o luxo com que vive. Esqueceu que isso era assunto para a sua rodinha de amigos milionários, aqueles que a Angélica mostra jogando golfe, praticando equitação, ou simplesmente ostentando (claro) o luxo de suas casas naquele pseudo-programa que passa imediatamente antes do programa de seu marido.

Em seu lamento, Huck pergunta quem compra os relógios roubados. Pois se ele não sabe, eu sei.

Sabe quem é? É quem sabe que existe isso, tem vontade de ter, mas não tem grana ou não quer gastar com um novo.

Tendo em vista que não combina com luxo não ser novinho em folha, acho mais provável que não seja um rico. Mas, se não é um rico, de onde o cara tirou essa idéia? Onde é que ele viu que existe rolex? Bem, acho que no braço de alguém, não é?

O problema é bem mais profundo e arraigado, é o mesmo motivo que leva as pessoas a gastar mais com roupas que com alimentação, andar de ônibus mas ter um Motorolla Rosa, fazer pós doutorado e não ter educação (que, no frigir dos ovos, se resume em enxergar e respeitar o outro, principalmente o que não tem nada pra te oferecer).

Quem ensinou que pra ser feliz você precisa de objetos inúteis? Quem ensinou que você precisa ser padrão? Deve ter sido muita gente, mas pelo menos duas dessas pessoas eu sei quem foram: Luciano e Angélica Huck! Sim, eles, quando fazem propaganda de jóias (aquela que a marca é um frango de luxo), de financeiras (que são agiotas legalizados, assim como bancos), ou de produtos para deixar o cabelo das meninas diferentes do que são, ou sei lá mais o quê - tudo isso que faz o sentido de existir a televisão, os outdoors, as revistas, novelas e etc, ordenando: seja patricinha de qualquer jeito, que é legal.

Claro que a minha análise beira o ridículo, uma vez que não sou estudei antropologia, sociologia, psicologia, e outras coisas complicadas de gente intelectual a fundamentar minhas opiniões, mas também não levo jeito para defender teses e dissertações formais e respeitáveis, tendo em vista minha vira-latisse imanente. Mas tenho a fantasia de que é mais verdadeira que essa conversinha clichê de playboy (ou de burguês, como diria o bicho-grilo de universidade federal) de movimento pela paz, ou de basta, e todos esses de sair andando na rua com camiseta branca domingo de manhã depois que alguém que eles conhecem morre na balada. Depois da manifestação, saem rumo à churrascaria Porcão e a novas formas de ostentação - quem sabe um modelo novo de caneta Mont-Blanc, ou uma de bolsa pra carregar cachorro da Louis Vitton, ou de capinha de ouro e brilhantes para guardar celular?

Então, Hucks, vou falar o seguinte pra vocês: fiquem caladinhos, tá? O negócio tá bom demais pra vocês.

E pra vocês, pobres que sonham com ouro: fiquem espertos.

Só a verdade nos libertará, nada existe fora. Eu acho.